sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

José Saramago - Memória como a de Elefante

Lembro-me do José Saramago sentado junto da tasquinha dos metalúrgicos Na Alameda D. Afonso Henriques. Ficava lá autografando os seus livros para leitores pouco prováveis: operários e trabalhadores com pouca escolaridade. Nessa altura era da parte dele um acto de militância mas também de generosidade. O homem de ar austero sabia de certo quanto valia. Os que como eu lhe sabiam o nome e lhe tinham lido uns livros sentiam orgulho pela sua notoriedade. Sentiam de alguma maneira que ele projectava o seu esforço anónimo, e lhe dava sentido e valor. Pergunto-me hoje se o seu subtil sorriso nos lábios enxutos seria por causa do Sol de Maio, do erro no cálculo da probabilidade face ao resultado de autógrafos oferecidos, ou da alegria de ser entre pessoas de trabalho comemorando o seu dia em liberdade. Memória como a de Elefante não serve para reviver dores do passado, serve para prevenir que as dores futuras aconteçam, ou no caso de não se poderem evitar, não sejam tão devastadoras.

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