sábado, 21 de junho de 2014

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Ginjinha, o licôr de ginja.

Nesta altura do ano quando a cereja chega ao fim aparecem as ginjas que são os frutos da Primavera serôdia. 
Ou porque me oferecem a aguardente ou porque me oferecem as ginjas uma coisa sempre leva à outra e a comunhão das duas é a única coisa que sei fazer; licôr de ginja.
Não tem nada de complicado, aprendi do meu pai aí por volta dos seis anos. É a idade ideal porque não se tem interesse pelas bebidas alcoólicas e tudo parece magia. Os frutos ora vermelhos translúcidos ora muito escuros como sangue venoso possibilitam logo diferentes tipos de licor. A aguardente deve ser boa, derramada na concha da mão não deve cheirar a fumo sinal que no alambique deixaram o bagaço queimar. Uma vez esfregada entre as palmas das mãos não deve cheirar a pôdre o que seria sinal que era proveniente da queima de vinhos voltos ou estragados. A gradação alcoólica deverá ser entre os 22 e os 40 por cento do volume.

Lavam-se as ginjas retiram-se os pedúnculos e deixam-se secar sobre um pano branco, liso e limpo. O peso das ginjas deverá ser igual ao de açúcar e por cada quilo de ginjas tem de se gastar um litro de aguardente e um pau de canela. 
Mais tarde e seguindo a tradição inerente à tradição, ou seja acrescentando um ponto ao que nos legaram; à  receita do meu pai acrescentei, um anís-estrelado e um cravinho da Índia.
A partir daqui são possíveis variações e acrescento de substâncias a gosto e a desgosto até ao limite da mixórdia.
Quando a aguardente é do ano e é muito agressiva às vezes com 60 graus, a ginja só deverá beber-se ao fim de dois anos. É o tempo para que na prática a madeira do caroço da ginja entre no processo de maturação da aguardente, a harmonize e a suavize na bôca. Há quem introduza uma lenho de madeira do cerne de carvalho, do tamanho de um pau de canela para que o processo seja mais rápido. A ginja recolhe a côr e o aroma da madeira perdendo a aspereza num ano.
Há quem prefira o açúcar mascavado ou o açúcar amarelo que é o meu caso, mas o açúcar branco refinado serve igualmente. No final o açúcar entra na mistura para adoçar e nesse sentido o refinado branco seria o mais indicado. Aliás era esse o que o meu pai usava; mas naquele tempo não havia açúcar refinado nas mercearias, o açúcar era sempre "amarelo" ou escuro ou claro, mas sempre amarelo. Ao açúcar branco chamávamos pilé e esse era o chamado açúcar purificado, vendia-se na farmácia. A não ser que alguém que trabalhásse na fábrica de refinação o arranjásse à socapa uma vez que era todo para exportar e o que havia era tão caro que só para preparados especiais ou coisa rara de igual valor como era a ginja do meu pai.

 Para terminar: A Ginjinha só está boa para ser bebida quando as ginjas assentarem no fundo. Quando se introduzem na garrafa elas vão ao fundo depois flutuam no líquido e depois gradualmente vão assentando uma a uma. Este prazo demora entre três meses e um ano. Tudo depende da húmidade dos frutos, da sua boa maturação, da quantidade de açúcar e do teor alcoólico da aguardente, ou seja de densidades. Há quem ponha as garrafas ao Sol, desconheço o efeito dos raios ultra-violeta e infravermelhos, mas parece-me que a radiação solar só serve para apressar a dissolução do açúcar e vaporizar algum álcool, tornando a maceração menos agressiva. Há quem agite ou revire as garrafas mas isso também só serve para forçar a dissolução do açúcar. O que é facto é que a Ginjinha quanto mais tempo esperar mais saborosa fica. Se puderem esperar.
A propósito, eu gosto muito de ginja, mas raramente bebo e acabo por oferecer quase toda a pessoas de quem gosto. De quem gosto mais do que da ginja.


quarta-feira, 18 de junho de 2014

O mundo flutuante - Ukiyo.

"Consoante aquilo que flutua, assim flutua emergindo em maior ou menor escala consoante a densidade do seu ser. Assim são as montanha de gêlo e as paredes de pedra. O mar tudo dissolve e afunda em pó e do pó faz a rocha que de novo ergue."


Ukyio é uma expressão japonesa que serve dois conceitos ou seja fonéticamente refere-se a mais do que uma palavra. 
É a maneira como o budismo japonês se refere à realidade aparente em que os seres vivem num ciclo de sofrimento contínuo de morte e reencarnação, poder-se-ía traduzir por O mundo flutuante - O mundo triste e designa a realidade dos sentidos desligada da espiritualidade.
Ukiyo - O mundo flutuante - é também a expressão que  designa uma maneira de estar urbana que durou desde a expulsão dos portugueses no Japão até quase ao final do século XIX, é o chamado Período Edo (1603 - 1868). 
 O mundo flutuante - enquanto expressão japonesa no Ocidente e para os ocidentais tornou-se sinónimo de belas estampas coloridas. As ilustrações feitas por grandes artistas, com grande habilidade e qualidade técnica eram entalhadas em blocos de madeira por mestres gravadores. Havia tantos blocos quantas as diferentes cores da ilustração. Sobre cada bloco entintado depositava-se a folha a imprimir e os mestres impressores tiravam até mais de dez cores em blocos sucessivos. Simplísticamente é como utilizar diferentes carimbos coloridos para criar uma ilustração complexa em que rigorosamente uma côr pára na linha de fronteira onde começa outra, ou se sobrepõe para criar outra côr nova.
Verdadeiramente O mundo flutuante designa também uma espécie de limbo espiritual, uma falta de propósito fundamental, um marasmo egoísta, uma apatia, mas que paradoxalmente influenciou as artes que viriam a estar na base da ideia contemporânea do séc. XX.
O dinheiro gerado pelas trocas comerciais iniciadas com os portugueses a partir de 1543 possibilitaram o desenvolvimento de uma classe de "mercadores" abastados que passaram a viver desafogadamente, mas aos quais o acesso ao poder estava vedado devido às restrições da organização social japonesa. Durante este período deu-se o apaziguamento do Japão. A sociedade feudal que se organizava na guerra entre senhores entrou em declínio talvez devido à introdução de armas de fogo pelos portugueses  e da execução de novas tácticas de combate. A guerra mudou e o Japão dividido tornou-se uma nação única em 1603. Os portugueses pagaram a sua ambição. Com a ajuda dos nossos vizinhos espanhóis que cá governavam na altura, a expansão política e o proselitismo religioso de Jesuítas e Dominicanos custou aos portugueses a expulsão do Japão. Muitos portugueses e japoneses cristãos pagaram com a vida: queimados vivos em fogueiras e cozidos em caldeirões de água a ferver, torturados até à morte;as atrocidades foram muitas de parte a parte. A derradeira tentativa de restabelecimento de relações comerciais foi em 1647,  já com D. João IV. Esta última tentativa de relacionamento com o Japão foi fracassada. Ficaram cidades francas e portos comerciais onde as trocas com Holandeses, se continuaram a fazer.

Katsushika Hokusai colecção de estampas japonesas de Picasso
Ora esta gente comercial japonesa começou a patrocinar o entretenimento para mitigar o tédio e a insatisfação, aplacar este desejo de mais alguma coisa. Apetecia-lhes algo mas não sabiam o quê. Esse desconsolo foi canalizado para o hedonismo de um Mundo Flutuante entre lutas de Sumô e Gueishas deslumbrantes, entre requintados repastos e alegorias teatrais, entre requintados assomos nostálgicos da vida no campo e na natureza  até recolhimentos ascéticos entre samurais sem guerras para travar. Mundo Triste é certo diriam monges xintoístas esperando pela construção de mais mosteiros para fidelizar novas vontades agora livres do assédio da ideia do Espírito Santo. 
Neste mundo de comunicação e faz de conta as estampas da vida quotidiana tornaram-se comuns, fosse para anunciar as peças de teatro Kabuki, fôsse para anunciar a beleza de uma gueisha tocadora de shamisen, ou simplesmente para mostrar aos urbanos a rusticidade da vida dos camponeses. Muitas destas estampas quando caíam fora de moda eram usadas como papel de enchimento nos "shoji", paineis de papel de arroz translúcidos ou não, que à semelhança do nosso tabique faziam a separação de espaços numa habitação. Posteriormente muitos destes papeis dos shoji serviam de protecção ao embalamento de todo o tipo de mercadoria desde peças de cerâmica a caixas de chá. Estas estampas são depois descobertas e recuperadas nomeadamente em França pelos impressionistas que se deslumbram com o exotismo dos motivos, com a exuberância da côr e com a qualidade da impressão.



Tudo isto a propósito do texto em epígrafe dos "dragon's teeth" e de como um deles pode ser a metáfora para O MUNDO FLUTUANTE em que vivemos.









terça-feira, 17 de junho de 2014

"dragon's teeth"


Acho que lhe chamam dentes de dragão "dragon's teeth", e são uma espécie de cones metálicos mais ou menos pontiagudos em metal inoxidável que atapetam pavimentos nas frontarias de edifícios. Costumam ser embutidos em zonas abrigadas onde seria possível dormir uma soneca ou mesmo passar a noite.
Apareceram nas notícias dos blogues como uma novidade londrina deste ano, mas eu tenho a impressão de que já os vi por cá; mas mais achatados e mais pontiagudos. Não me lembro onde foi porque o olhar com que os vi não os soube interpretar, apercebi-os como embelezamento arquitectónico e devo tê-los arrumado naquela parte da memória reservada às coisas sem importância. 
Começamos por espantar os pombos dos monumentos, agora as pessoas dos alpendres. Onde perdemos nós a hospitalidade.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Apedêutica Televisiva para a transformação do cidadão em Adepto Adicto.


























Heróis do gramal, do pobre povo
Selecção plangente e desigual,
Brincai hoje de novo
No calor tropical,
Entre o rosa choque sem memória
O laranja troça de nós
Com suas setas de algoz
Arruinando até a história

Bisarmas, bisarmas,
Nossa terra, estão a roubar
Fantasmas com plasmas
Sicários a enganar
Miúdos de calções jogar, a jogar!



terça-feira, 10 de junho de 2014

Lírica de Luiz Vaz de Camões dita por José de Castro; numa preciosa publicação de José Daniel Ferreira.




Aos 19:25 excertos de "Sôbolos rios que vão" da 1ª redondilha à 4ª, da redondilha 19ª à 27ª, do 6º verso da 32ª redondilha ao final da 37ª.




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LUIZ VAZ DE CAMÕES - Sôbolos rios que vão

Super Flumina 
 
REDONDILHAS DE BABEL E SIÃO
1
Sôbolos rios que vão por Babilónia, me achei,
Onde sentado chorei
as lembranças de Sião
e quanto nela passei.
Ali, o rio corrente
de meus olhos foi manado,
e, tudo bem comparado,
Babilónia ao mal presente,
Sião ao tempo passado


2

Ali, lembranças contentes
n'alma se representaram,
e minhas cousas ausentes
se fizeram tão presentes
como se nunca passaram.
Ali, depois de acordado,
co rosto banhado em água,
deste sonho imaginado,
vi que todo o bem passado
não é gosto, mas é mágoa.


3
E vi que todos os danos
se causavam das mudanças
e as mudanças dos anos;
onde vi quantos enganos
faz o tempo às esperanças.
Ali vi o maior bem
quão pouco espaço que dura,
o mal quão depressa vem,
e quão triste estado tem
quem se fia da ventura.


4
Vi aquilo que mais val,
que então se entende milhor
quanto mais perdido for;
vi o bem suceder o mal,
e o mal, muito pior,
E vi com muito trabalho
comprar arrependimento;
vi nenhum contentamento,
e vejo-me a mim, que espalho
tristes palavras ao vento.


5
Bem são rios estas águas,
com que banho este papel;
bem parece ser cruel
variedade de mágoas
e confusão de Babel.
Como homem que, por exemplo
dos transes em que se achou,
despois que a guerra deixou,
pelas paredes do templo
suas armas pendurou:


6
Assi, despois que assentei
que tudo o tempo gastava,
da tristeza que tomei
nos salgueiros pendurei
os órgãos com que cantava.
Aquele instrumento ledo
deixei da vida passada,
dizendo: -- Música amada,
deixo-vos neste arvoredo
à memória consagrada.


7
Frauta minha que, tangendo,
os montes fazíeis vir
para onde estáveis, correndo,
e as águas, que iam decendo,
tornavam logo a subir:
jamais vos não ouvirão
os tigres que se amansavam,
e as ovelhas, que pastavam,
das ervas se fartarão
que por vos ouvir deixavam.


8
Já não fareis docemente
em rosas tornar abrolhos
na ribeira florecente;
nem poreis freio à corrente,
e mais, se for dos meus olhos.
Não movereis a espessura,
nem podereis já trazer
atrás vós a fonte pura,
pois não pudeste mover
desconcertos da ventura.


9
Ficareis oferecida
à Fama, que sempre vela,
frauta de mim tão querida;
porque, mudando-se a vida,
se mudam os gostos dela.
Acha a tenra mocidade
prazeres acomodados,
e logo a maior idade
já sente por pouquidade
aqueles gostos passados.


10
Um gosto que hoje se alcança,
amanhã já o não vejo;
assi nos traz a mudança
de esperança em esperança,
e de desejo em desejo.
Mas em vida tão escassa
que esperança será forte?
Fraqueza da humana sorte,
que, quanto da vida passa,
está receitando a morte?


11
Mas deixar nesta espessura
o canto da mocidade,
não cuide a gente futura
que será obra da idade
o que é força da ventura.
Que idade, tempo, o espanto
de ver quão ligeiro passe,
nunca em mim puderam tanto
que, posto que deixe o canto,
a causa dele deixasse.


12
Mas, em tristezas e nojos,
em gosto e contentamento,
por sol, por neve, por vento,
tendré presente á los ojos
por quien muero tan contento.
Órgãos e frauta deixava,
despojo meu tão querido,
no salgueiro que ali estava
que para troféu ficava
de quem me tinha vencido.


13
Mas lembranças da afeição
que ali cativo me tinha,
me perguntaram então:
que era da música minha
que eu cantava em Sião?
Que foi daquele cantar
das gentes tão celebrado?
Porque o deixava de usar?
Pois sempre ajuda a passar
qualquer trabalho passado.


14
Canta o caminhante ledo
no caminho trabalhoso,
por entre o espesso arvoredo;
e, de noite, o temeroso,
cantando, refreia o medo.
Canta o preso docemente
os duros grilhões tocando;
canta o sagador contente;
e o trabalhor, cantando,
o trabalho menos sente.


15
Eu, que estas cousas senti
n'alma, de mágoas tão cheia,
- Como dirá, respondi,
quem alheio está de si
doce canto em terra alheia?
Como poderá cantar
quem em choro banha o peito?
Porque, se quem trabalhar
canta por menos cansar,
eu, só, descansos enjeito.


16
Que não parece razão
nem seria cousa idónea,
por abrandar a paixão,
que cantasse em Babilónia
as cantigas de Sião.
Que, quando a muita graveza
de saudade quebrante
esta vital fortaleza,
antes moura de tristeza
que, por abrandá-la, cante.


17
Que se o fino pensamento
só na tristeza consiste,
não tenho medo ao tormento:
que morrer de puro triste,
que maior contentamento?
Nem na frauta cantarei
o que passo, e passei já,
nem menos o escreverei,
porque a pena cansará,
e eu não descansarei.


18
Que, se a vida tão pequena
se acrescenta em terra estranha,
e se amor assi o ordena,
razão é que canse a pena
de escrever pena tamanha.
Porém se, para assentar
o que sente o coração,
a pena já me cansar,
não canse para voar
a memória em Sião.


19
Terra bem-aventurada,
se, por algum movimento,
d'alma me fores mudada,
minha pena seja dada
a perpétuo esquecimento.
A pena deste desterro,
que eu mais desejo esculpida
em pedra, ou em duro ferro,
essa nunca seja ouvida,
em castigo de meu erro.


20
E se eu cantar quiser,
em Babilónia sujeito,
Hierusalém, sem te ver,
a voz, quando a mover,
se me congele no peito.
A minha língua se apegue
às fauces, pois te perdi,
se, enquanto viver assi,
houver tempo em que te negue
ou que me esqueça de ti.


21
Mas ó tu, terra de Glória,
se eu nunca vi tua essência,
como me lembras na ausência?
Não me lembras na memória,
senão na reminiscência.
Que a alma é tábua rasa,
que, com a escrita doutrina
celeste, tanto imagina,
que voa da própria casa
e sobe à pátria divina.


22
Não é, logo, a saudade
das terras onde nasceu
a carne, mas é do Céu,
daquela santa Cidade,
donde esta alma descendeu.
E aquela humana figura,
que cá me pode alterar,
não é quem se há-de buscar:
é raio da Fermosura,
que só se deve de amar.


23
Que os olhos e a luz que ateia
o fogo que cá sujeita,
não do sol, mas da candeia,
é sombra daquela Ideia
que em Deus está mais perfeita.
E os que cá me cativaram
são poderosos afeitos
que os corações têm sujeitos;
sofistas que me ensinaram
maus caminhos por direitos.


24
Destes o mando tirano
me obriga, com desatino,
a cantar ao som do dano
cantares de amor profano
por versos de amor divino.
Mas eu, lustrado co santo
Raio, na terra de dor,
de confusão e de espanto,
como hei-de cantar o canto
que só se deve ao Senhor?


25
Tanto pode o benefício
da Graça, que dá saúde,
que ordena que a vida mude;
e o que tomei por vício
me faz grau para a virtude;
e faz que este natural
amor, que tanto se preza,
suba da sombra ao Real,
da particular beleza
para a Beleza geral.


26
Fique logo pendurada
a frauta com que tangi,
ó Hierusalém sagrada,
e tome a lira dourada,
para só cantar de ti.
Não cativo e ferrolhado
na Babilónia infernal,
mas dos vícios desatado,
e cá desta a ti levado,
Pátria minha natural.


27
E se eu mais der a cerviz
a mundanos acidentes,
duros, tiranos e urgentes,
risque-se quanto já fiz
do grão livro dos viventes.
E tomando já na mão
a lira santa e capaz
doutra mais alta invenção,
cale-se esta confusão,
cante-se a visão da paz.


28
Ouça-me o pastor e o Rei,
retumbe este acento santo,
mova-se no mundo espanto,
que do que já mal cantei
a palinódia já canto.
A vós só me quero ir,
Senhor e grão Capitão
da alta torre de Sião,
à qual não posso subir,
se me vós não dais a mão.


29
No grão dia singular
que na lira o douto som
Hierusalém celebrar,
lembrai-vos de castigar
os ruins filhos de Edom.
Aqueles que tintos vão
no pobre sangue inocente,
soberbos co poder vão,
arrasai-os igualmente,
conheçam que humanos são.


30
E aquele poder tão duro
dos afeitos com que venho,
que encendem alma e engenho,
que já me entraram o muro
do livre alvídrio que tenho;
estes, que tão furiosos
gritando vêm a escalar-me,
maus espíritos danosos,
que querem, como forçosos,
do alicerce derrubar-me;


31
Derrubai-os, fiquem sós,
de forças fracos, imbeles,
porque não podemos nós
nem com eles ir a Vós
nem sem Vós tirar-nos deles.
Não basta minha fraqueza
para me dar defensão,
se vós, santo Capitão,
nesta minha fortaleza
não puserdes guarnição.


32
E tu, ó carne que encantas,
filha de Babel tão feia,
toda de misérias cheia,
que mil vezes te levantas,
contra quem te senhoreia:
beato só pode ser
quem, co a ajuda celeste,
contra ti prevalecer,
e te vier a fazer
o mal que lhe tu fizeste.


33
Quem, com disciplina crua,
se fere que ua vez,
cuja alma, de vícios nua,
faz nódoas na carne sua,
que já a carne n'alma fez.
E beato quem tomar
seus pensamentos recentes
e em nacendo os afogar,
por não virem a parar
em vícios graves e urgentes.


34
Quem com eles logo der
na pedra do furor santo,
e, batendo, os desfizer
na Pedra, que veio a ser
enfim cabeça do Canto;
quem logo, quando imagina
nos vícios da carne má,
os pensamentos declina
àquela Carne divina
que na Cruz esteve já;


35
Quem do vil contentamento
cá deste mundo visível,
quanto ao homem for possível,
passar logo o entendimento
para o mundo inteligível:
ali achará alegria
em tudo perfeita e cheia
de tão suave harmonia,
que, nem por pouca, recreia,
nem, por sobeja, enfastia.


36
Ali verá tão profundo
mistério na suma Alteza,
que, vencida a natureza,
os mores faustos do mundo
julgue por maior baixeza.
Ó tu, divino aposento,
minha pátria singular!
Se só com te imaginar
tanto sobe o entendimento,
que fará se em ti se achar?


37
Ditoso quem se partir
para ti, terra excelente,
tão justo e tão penitente
que, depois de a ti subir
lá descanse eternamente.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Foi publicado hoje: A MORTE SEM MESTRE - Herberto Helder




Acabei de o comprar na Feira do Livro de Lisboa, na Porto Editora.
Um cartaz dizia "um exemplar por cliente".
Um autêntico racionamento. 

Piano de Fundo

O Piano de Fundo 
Acompanhamento musical para Festas: 
Festas de Finalistas, Despedidas de Solteir@, Casamentos, Baptizados, Festas Particulares, Pompas Fúnebres e outros Eventos.
(Se necessário, o pianista pode tocar de olhos vendados.)



O meu humilde tributo aos músicos, aos instrumentistas, aos intérpretes musicais que tanto amo e que contra todo o ruído e toda a surdina que os abafa fazem o "Piano de Fundo". Bem hajam!
                                                                                                                              Luís Filipe Gomes



domingo, 1 de junho de 2014

"Angelitos negros" cantado por Antonío Machín(1903-1977)





Pintor nacido en mi tierra
Con el pincel extranjero
Pintor que sigues el rumbo
De tantos pintores viejos
Aunque la virgen sea blanca
Píntale angelitos negros
Que también se van al cielo
Todos los negritos buenos
Pintor si pintas con amor
Por qué desprecias su color?
Si sabes que en el cielo
También los quiere Dios
Pintor de santos de alcoba
Si tienes alma en el cuerpo
Por qué al pintar en tus cuadros
Te olvidaste de los negros
Siempre que pintas iglesias
Pintas angelitos bellos
Pero nunca te acordaste
De pintar un ángel negro

  LETRA: Andrés Eloy Blanco (1896-1955). MÚSICA: Manuel Álvarez Maciste.


Massacre dos inocentes.

Hoje comemoramos o Dia Mundial da Criança, outros países comemoram este dia a 20 de Novembro data da resolução de aprovação da comemoração pela ONU. 
Não importam tais pormenores. O que é facto é que lá pela Síria, onde terá acontecido o "Massacre dos Inocentes" que vem referido na Bíblia, hoje, em nossos dias, continua o massacre de crianças. De crianças e de adultos, das mães e dos pais dessas crianças. Massacre inominável, feito por outros seres humanos a soldo da ganância da ambição de poder e da crueza de espírito. Pior do que este genocídio localizado e enquadrado pela guerra são outros genocídios diários em tantas outras partes do Mundo silenciosos e secretos de que não ouvimos sequer falar.